Nove dias úteis
Essa semana pediu-me uma boneca.
Mais uma! Procurou nas lojas através da internet e me mostrou a eleita para
seus nove aninhos. Olhei, comparei os valores entre as lojas e efetuei o
pedido. Estando tudo certo, recebi uma mensagem que a encomenda chegaria em “nove dias úteis”. E é sobre isso que pretendo tomar a atenção
de vocês a estas linhas. Desde já peço devidas escusas pelo incômodo e por
desviar as atenções para este aprendiz de escritor.
Sabemos que os “dias úteis” são os
dias tradicionalmente comerciais ou de trabalho mais comuns, ou seja, de
segunda a sexta-feira. Mas sendo eu um nefelibata, alguém que vive nas nuvens, teço
uma meditação sobre isso. Rogo paciência a vocês.
Se há os dias úteis, haverá também
os inúteis? Se hoje domingo fosse, iria à igreja com a família, almoçaríamos em
algum restaurante, leríamos um pouco, café, cinema... Ou ficaria em casa
assistindo a um filme com filhos e esposa deitados todos na mesma cama... Teria
sido um dia inútil?
Em verdade talvez essas poucas horas
seriam mais úteis à minha saúde mental, física e espiritual que todos os outros
dias juntos.
Todos os dias me são úteis. Cada dia
que acordo agradeço ao Pai Celestial (em quem deposito minha confiança neste
mundo cada vez mais estranho). Agradeço a oportunidade de estar vivo! Agradeço
pela família feliz e abençoada. Agradeço e peço direção em minha profissão –
uma das mais belas que há. Agradeço por me permitir estender a mão a um
necessitado de afeto, conforto e atenção.
Quando encontro os pacientes nos
corredores do hospital, aflitos ante ao sofrimento, sob angústia e insegurança,
o fato de eu poder explicar, conversar, consolar e amparar já faz parte da
ministração da cura. Não podemos nos esquecer do antigo aforismo: “curar algumas vezes, aliviar outras, consolar
sempre!”
Agradeço ao Pai Eterno que, além de
me permitir exercer a medicina, concedeu a graça de ser professor (ao menos
tento) dessa mesma arte! Ensinar às novas gerações de médicos! Não é uma fácil
tarefa. Mas é imensamente gratificante. Honra-me servi-los com alguns de meus
parcos talentos.
Medicina
é servir!
Ensinar
é servir!
Uma vez este austero senhor estava em
visita médica aos pacientes no hospital escola acompanhado de alguns alunos.
Enquanto conversava com um paciente, numa maca em corredor frio de hospital,
segurei a mão daquele paciente (um senhor idoso debilitado) e a acariciei,
tentando consolá-lo e confortá-lo naquele estado das coisas. Aquele paciente
poderia ser meu pai, poderia ser eu deitado na maca (nem cama confortável era)
ou algum ente querido. Embora fosse um desconhecido, era um irmão em humanidade
e necessitado de ajuda. Tão digno ou mais até do que um rei. Pois este terá o
melhor que a mesa farta pode dar. Já aquele terá mui vez que se contentar com
as migalhas que lhe são oferecidas. O senhor idoso permanecia em ambiente
estranho, em meio à correria, mortes, choro, dor e náufrago num mar de
impessoalidade.
Segurei e acariciei a mão daquele
senhor. Ele sorriu e eu também. Houve entre nós uma troca de afeto, de
singeleza e de ânimo que a ciência não explica. Um conforto que não se
administra nos frascos de soro.
Usem da tecnologia e de todo conhecimento
técnico. Mas sejam caridosos e saibam ouvir. Ajam com firmeza quando necessário
o for. E saibam que a palavra doce dada em hora certa cicatriza as feridas da
alma.
Que haja amor em todos os atos!
Só haveria dias não úteis caso não
houvesse amor no mundo.
Amor em todos os atos!
Agradeço a Deus por permitir que
todos meus dias sejam úteis!
O apóstolo Paulo escreveu que: “Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes
três, mas o maior destes é o amor”.
Que haja amor em seus atos e que
todos os seus dias sejam úteis!
Londrina, maio
de 2016.
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