Veremos em que dá...

Blog pessoal de Lucio Baena de Melo.

Li hoje que milhares de blogs são criados diariamente e não duram mais que 6 meses.

EIS MAIS UM FORTE CANDIDATO!

Tentarei escrever aqui alguns pensamentos, comentários sobre o dia a dia que se vive embaixo do sol...

Este foi o primeiro post e o deixarei aqui pois explica o título do blog: Um Peregrino.
Por que "Um Peregrino?"

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

A QUEM HONRA, HONRA. Quase um ano sem o nosso Ary...


Até breve,
 Almirante!

Eu o chamava assim: Almirante. Ele me chamava de "Capitão Ilustre"! Logo eu, fidalgo em nada e comandante de ninguém.

Conheci Ary através do querido casal de médicos Etel e Luiz Gabriel, em um jantar na casa de meu digno e honrado professor da faculdade de medicina, o Prof. Dr. Adelmo Ferreira. Nesta noite recebemos o convite para conhecer a Igreja Batista Catuaí. Eu freqüentava com a família, não com assiduidade, uma outra igreja evangélica; mas não estávamos contentes por várias razões. Inicialmente não demonstrei muito interesse pelo convite até que Gabriel soube lançar uma boa moeda de troca: "Apareça lá, a gente tem um intervalo quando é servido um café!" Respondi que qualquer dia iríamos conhecer a igreja e tomar um cafezinho com eles. O casal querido não sabia que um bom café é uma das coisas que faz minha vida ser mais feliz. 

Visitamos a igreja no domingo seguinte. Um salão pequeno e aconchegante: a Igreja Batista Catuaí! O nome era convidativo, catuaí é uma variedade de café e eu sou meio fanático pela escura, quente e amarga bebida! 

Um calvo e sorridente senhor nos recebeu de forma calorosa e assistimos a reunião - embora confesso que parte de minha preocupação residia na qualidade, temperatura, moagem e sabor do café que ser-me-ia servido. Não recordo o sermão e tampouco a qualidade do café... Só sei que de lá não mais saímos.

Não me recordo nestes anos ter visto alguém de forma tão clara, tão simples, tão atual e de forma tão apaixonada expor o Evangelho da Cruz de Cristo.  Ary conseguia trazer as verdades da Palavra de Deus para os nossos dias e para a prática da vida diária.

Gostava muito de futebol e do Palmeiras (o que pra mim é indiferente, já que somos "rivais"); no entanto, admirava Machado de Assis. Curiosamente em nossas conversas sobre livros - uma paixão compartilhada - vimos que sabíamos alguns mesmos sonetos de cor. Comentamos, por mais de uma vez, o soneto publicado no "Relíquias da Casa Velha", o derradeiro livro que Machado dedicara ao amor de sua vida, Carolina Augusta Xavier de Novais.

E assim como Machado encontrou sua Carolina portuguesa, nosso querido Ary teve os melhores e mais felizes momentos de sua vida ao lado de outra Carolina, só que esta veio da América do Norte. A linda loura americana levou o mineiro às nuvens. E assim o foi pelos mais de quarenta vividos em amor que viveu nosso nefelibata. Carolina era sua preciosidade! No dizer machadiano:

"Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro
Que, a despeito de toda a humana lida,
Fez a nossa existência apetecida
E num recanto pôs um mundo inteiro."

Quem os conhecia, sabia o que era um amor devotado. Um exemplo!

Determinado domingo, perguntei sobre algum tema que não me era claro e ele me disse: "Batuta, vá em meu escritório esta semana tomar um café e vamos conversar!" Eu fui, e dessa vez, mesmo que não houvesse o café, eu teria ido.

Passamos nos reunir semanalmente. Cada semana conversávamos sobre um texto da Bíblia, sobre a carta de Romanos, sobre nossos filhos, nossos casamentos, as esposas, a igreja, a vida diária. Ele me dizia coisas pessoais que eu ficaria encabulado de fazê-lo, se fosse o inverso. Mas a proximidade e a confiança nos permitia fazê-lo. Assim era meu Almirante. Simples, sábio, humano e verdadeiro. 

Estudando a Bíblia com Ary e sendo por ele incentivado revisitei meus heróis do passado: John Wesley e Martyn Lloyd-Jones. O primeiro arminiano e o segundo calvinista. Lloyd-Jones era um médico de prestígio que decidiu abandonar a carreira médica e pastoreou uma pequena igreja em Gales. Posteriormente por 30 anos serviu na Westminster Chapel e foi um dos escritores protestantes mais profílicos do século XX. Hoje possuo toda sua obra. E aprendo com seus ensinamentos.

Lloyd-Jones escreveu 14 volumes sobre a carta do Apóstolo Paulo aos Romanos. O Almirante sempre dizia que seu livro predileto da Bíblia era Romanos. É conhecida a série de estudos de Ary sobre o tema. Quem o conheceu certamente o ouviu falar as 6 palavras chaves de Romanos (Problema, Solução, Vida, Israel, Conduta e Conclusão). Ou o "DDD" de Efésios (Doutrina, Deveres e Defesa). 

Aprendemos com Ary uma de suas máximas e o significado dela: "Temor a Deus é aprender levar Deus a sério!" Quantas vezes o ouvimos falar sobre isto? E como descobrimos com ele que levar Deus a sério está relacionado na observação, interpretação e aplicação de conceitos bíblicos à prática diária... Ary nos dizia no discipulado que aprendera estudar a Bíblia com Howard Hendricks e através dos ensinamentos e disciplina adquiridos nos passava o esquema "ÓIA": Observação, Interpretação e Aplicação da Palavra de Deus. 

Uma vez viajamos para uma cidade próxima - umas duas horas de viagem - e Ary me contou parte de sua vida e suas experiências. Contou a influência de Rosalee Appleby, disse sobre seus estudos e seus professores nos EUA, o início e dificuldades na formação da Igreja Batista do Morumbi. Era um visionário. Fomos privilegiados em tê-lo estes anos em Londrina. 

Um dia conversávamos sobre textos bíblicos prediletos. Ary sempre comentava sobre a carta de Romanos e sobre o versículo de Filipenses, que foi o mote de sua vida: ..."o viver é Cristo e o morrer é lucro". Eu sempre dizia que meu texto predileto é o capítulo 11 de Hebreus, onde há a descrição dos exemplos e heróis da fé, em especial os versos 13 a 16:

"Todos estes morreram na fé, sem terem alcançado as promessas; mas tendo-as visto e saudado, de longe, confessaram que eram estrangeiros e peregrinos na terra. Ora, os que tais coisas dizem, mostram que estão buscando uma pátria. E se, na verdade, se lembrassem daquela donde haviam saído, teriam oportunidade de voltar. Mas agora desejam uma pátria melhor, isto é, a celestial. Pelo que também Deus não se envergonha deles, de ser chamado seu Deus, porque já lhes preparou uma cidade."

Assim eu termino: meu saudoso e pranteado Ary, estrangeiro e peregrino nesta terra! Tu chegastes agora à Patria Celestial e alcançastes a promessa. Tua vida foi um exemplo, fostes um diamante. Certamente Deus não se envergonhou de ser chamado o seu Deus!

Saudades de ti, Almirante!

L.

Londrina, 23.VI.2012