O banquinho de madeira*
Réquiem.
Cogitei levar minha esposa e
crianças com o intuito de se obter um retrato junto a ti. Seria uma lembrança
de onde tudo começou e os frutos que vieram. Assim, fui te visitar almejando
esse reencontro e não mais estavas lá. Senti (e ainda sinto) tua ausência.
Deste
singelo fato percebo duas lições: a efemeridade das coisas materiais e o tempo
que se esvai como areia entre os dedos. Aquele tão batido ditame “não deixe pra
amanhã o que pode ser feito hoje” aqui caiu como a luva.
Eu me pergunto o tanto que visualizastes
ou fostes partícipe nestes mais de 20 anos de tua honrosa existência. Quantas
brigas entre casais, quantas discussões entre os alunos sobre escalas e outros
assuntos, conversas entre docentes, temor perante os exames e regozijo após um
resultado favorável. Tu foste testemunhas de tantos momentos.
Quantos
familiares por ti em pranto passaram dominados pelo medo, angústia ou esperança
em razão do estado de saúde de um ente querido... Ou quantas crianças se
sentaram junto a seus pais, com os bracinhos amarrados naquela tábua e
carregando aquele horrível suporte das medicações injetáveis...
Quantos
acertos testemunhaste...
Quantos
erros e desencontros também vivenciaste.
E
falando em desencontros recordo-me da frase de Vinícius de Moraes: “A vida é a arte do encontro embora haja tanto
desencontro pela vida”. Citando-a, lembro e ratifico que um dos maiores
encontros e acertos que viste, ou melhor, foste grande partícipe e personagem,
foi iniciado há vinte e um anos quanto tive a oportunidade de encontrar aquela
que seria o grande amor de minha vida. Oh, que encontro permitiste!
Às vezes me sinto um tolo ao
escrever sobre um objeto sem vida.
No entanto, tua madeira alguém
plantou, regou e cuidou até se tornar frondosa árvore a oferecer sombra e
refrigério quiçá a algum casal apaixonado. Li que teu ferro foi extraído de uma
série de minérios depositados por anos e anos na natureza; e que foi necessária
adição de carvão e carbono temperado a fogo pra dar rigidez e formas
necessárias. O carvão pega fogo com facilidade. Os diamantes derivam do carbono
que está inserido em teu metal. Aprendi
que o cimento é uma mistura de materiais que é aquecida a 1500 ◦C até que
ela se funde e forma uma substância sólida que dá sustentação a quase tudo
que a gente vê pelas ruas. Que interessante.
Naquele
31 de maio de 1995, o que encontro que presenciaste me fez incandescer. Naquele
dia duas almas se aqueceram, se fundiram ante o calor proporcionado e desse
encontro surgiu um diamante. E é esse diamante que é constantemente lapidado: a
joia do amor de nossas vidas.
Com
o passar dos anos tua madeira foi apodrecendo e teu ferro enferrujou. A madeira
e ferro estão sujeitos às ameaças do tempo. Há que se ter preparo e cuidado a
fim de que permaneçam belos e protegidos.
Esqueceram
de ti, banquinho. Eu mesmo te negligenciei. Trouxeste tantas benesses e no
entanto não cuidei de ti, de teu bem-estar. Logo eu que tanto te exaltei.
Meses
atrás passei por ti e vi que tua madeira estava podre. Peguei um pedaço que
estava ao chão e pra casa levei. Cuidei, poli e estás aqui ao lado como
lembrança daquilo que representas pra mim.
Tu não mais existes. A
madeira, o cimento e o metal não foram capazes de resistir às agruras do tempo.
Mas o que viste nascer e frutificar, que é o amor entre duas pessoas, isso
permanece e é aperfeiçoado. Ainda que venham as tempestades da vida, esse
diamante permanece cada vez mais belo e valioso, e que o seja para sempre.
* http://luciobaena.blogspot.com.br/2015/05/o-banquinho-de-madeira-20-anos_31.html
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