Procura-se
Um Homem Honesto
Prof. Waldir Eduardo Garcia |
Há mais de dois mil anos vagava pelas ruas de
Atenas o filósofo Diógenes. Vestido como um maltrapilho e quase nu, a narrativa
é que durante o dia carregava uma lanterna acesa em punho, e declamava pela
cidade:
“Procura-se um Homem
Honesto!
Procura-se um Homem Honesto!”
Procura-se um Homem Honesto!”
Nossa escola de Medicina esta semana viu-se destituída de uma das colunas
principais que lhe dava sustentação. No último dia 14 de dezembro, às 10 horas da
manhã, cerrava os olhos para esta vida e adentrava à imortalidade o pranteado
Waldir Eduardo Garcia.
Médico impregnado até à medula. Excessivamente bom,
dedicado, humilde e solícito. Daqueles bons que se encontram poucos pela vida.
Sei que durante seu trajeto pela nossa escola recebeu inúmeras homenagens!
Todas merecidas, mas nenhuma à altura do que este homem nos representou, até
porque desconheço alguma homenagem que lhe seja justa em virtude da
incomensurável bondade e nobreza de espírito que lhe eram inerentes. Ou
seja, por mais que o homenageamos e o honramos em vida, isto foi pouco se
comparado ao que merecia. No entanto, ele pouco se importava com as honrarias mundanas. Era um vinho de rara pipa!
Nas mídias sociais jorraram gestos de homenagem e
consideração a este homem que a todos nos tocou. Foi nosso pai, nosso amigo, nosso irmão. Sempre que nos encontrávamos – e isto era quase todos os dias – ele
dedicava alguns minutos a saber de mim, como eu estava, perguntava de minha
esposa e meus filhos pelo nome. Eu lhe dizia que minha barba estava ficando
igual à dele e ele ria e respondia que queria ter a barba como a minha, que
ainda é escura, já que a dele branqueou. E eu emendava: eu te dou um pouco de
barba preta e você me dá um pouco da tua pra cobrir minha calvície. Piadinhas bobas que
sempre fazíamos um com o outro.
Na verdade, Waldir, eu não queria ter uma barba como a
sua. Eu queria ser gente como você! Eu queria ter a decência que você teve em
vida. Eu queria ter o sorriso franco e alentador que você nos oferecia. Eu
anelo um dia ter um pouco do conhecimento que você teve e a capacidade de nos
confortar e dar direção nas horas de desespero nos embates do dia a dia. Eu um
dia sonho em ter a humildade que você teve e pra isso a gente tem que esvaziar de
si mesmo. Como a gente vive envolta em confrontos, em meio à ganância, inveja, dissensões...
Por que em nosso meio há tanta disputa? Por que em vez de se “amar o próximo” o
que se vê é puxar o tapete do próximo? Precisamos nos desprender disso tudo e
deixar reinarem o amor, a paz, a mansidão. Aprendo muito com você, meu amigo!
Aprendi que vale é ter amigos com quem contar, que uma família
sólida é um arcabouço pra se viver feliz. Que o amor e respeito devem ser soberanos. Aprendi que há trigo no meio do joio. Aprendi que há diamante em meio ao carvão.
Como era lindo e apreciável encontrar você e a Jurema. Eram nítidos o amor e a cumplicidade. Qual casal que ao se deparar com vocês e ver a maneira que falavam de seus filhos, não pensaria dentro em si: "Gostaria de ser como Waldir e Jurema"...
Como era lindo e apreciável encontrar você e a Jurema. Eram nítidos o amor e a cumplicidade. Qual casal que ao se deparar com vocês e ver a maneira que falavam de seus filhos, não pensaria dentro em si: "Gostaria de ser como Waldir e Jurema"...
Hoje eu
sinto um vazio, Waldir. Eu sinto um oco
dentro de mim. Parece que algo foi-me arrancado. Fui ao teu setor e você não
estava lá, Waldir! Aquilo tudo respira você e você não estava lá, Waldir!
Esta
semana abracei teu discípulo Marcel. Foi um abraço sentido, demorado, de órfãos
que se encontram. Cai sobre esta geração mais nova de teus alunos (Kunii, Marcel, Fabrízio e
outros) a responsabilidade de honrar o teu legado. Tarefa árdua! Entretanto, não será
difícil tendo em vista o alicerce e conselhos partilhados por você, além da imorredoura
imagem do mestre.
Lembro agora o poema de John Donne:
"Nenhum homem é uma ilha isolada, cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra, se um torrão é arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa dos teus amigos ou a tua própria; a morte de qualquer homem diminui-me, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti".
Como eu me sinto diminuído, Waldir. O quanto eu me sinto pequeno! Você era uma luz que brilhava na escuridão de nossas incertezas. Você era o prumo que nos alertava a dar escorreitos passos pela vida profissional e acadêmica. Você era o modelo do perfeito docente. Você era uma rocha em caráter, adamantino em sua retidão.
Diógenes, o maltrapilho filósofo de Atenas que em pleno
dia empunhava uma lanterna, se vivo fosse, teria nestes dias alcançado a cura
dos anseios de sua alma! Teria em ti, meu saudoso Waldir, encontrado o homem
que há séculos estava a sua procura.
Saudades,
L.
Saudades,
L.